Ser actor porno não é tão fácil como parece
Publicado em 2014-12-03 na categoria SexMundi / Reportagens


Há uma casa no centro de Madrid onde qualquer pessoa que seja maior de idade e mande uma chapa do B.I. pode viver as suas fantasias mais obscuras. Do portão, entram e saem, em intervalos de meia hora, vizinhos que passeiam o cão, senhoras da idade da minha avó e actrizes porno. Este sábado, sete gajos entre os 20 e os 35 anos esperam em frente ao intercomunicador. Vêm participar na rodagem de um glory hole, “buraquinho da glória”.

A cena consiste em meter a pila num buraco que dá a uma cabine onde está uma rapariga, e a partir daí é com eles. Nenhum dos dois pagou para estar ali, nem cobrará um cêntimo pelos direitos de imagem. Não são actores pornográficos, e a maioria vem pelo prazer que lhes dá a perversão, embora alguns admitam que gostassem de fazer vida disso. A Villacerda - entenda-se, Vila Porcalhona - é uma casa de 375 metros quadrados onde só existe um requisito mínimo. Pô-la dura. Super fácil? Talvez não.

O Jaime chega nervoso. É a sua primeira cena e nota-se bem, porque é o único que não está no bando. Os outros não é que falem muito, mas dá para ver que são da malta. Têm aquele olhar cúmplice de quem já partilhou a mesma experiência. Também não é a primeira que vez que estão todos descascados uns ao pé dos outros. Como explica Santiago, um dos assíduos: “ Depois de 17 bukkakes e 4 glory holes não há cá vergonhas”. Mas fala baixinho, encostado à parede do portão. O rendez-vous é às sete da tarde, e este técnico de manutenção de aeronaves, de 26 anos - e com aspirações no mundo do cinema para adultos - chegou uma hora antes. “Assim não estou à espera em casa”, remata. Vive com os pais, e segundo nos conta, decidiu experimentar coisas novas depois de acabar com a namorada. Um ano depois já sabe que aquilo que mais curte são os bukkakes: “Tens melhores vistas, e mais onde tocar”.

Nesta outra modalidade a mulher está no chão, de joelhos, rodeada de homens que fazem turnos para ejacular em cima dela. Jaime, o maçarico, observa o grupo. Desconcertado e curioso. Há quatro meses que estava no vai-não-vai. “Foi difícil decidir. Vês os vídeos e sentes a cena, mas estar aqui todo nu é outra coisa. “Pelo menos o glory é às escuras, e vê-se menos”, diz o electricista de 31 anos. Quase todos estão solteiros, mas todos têm família e amigos. “Este ambiente dá-te muita pica, pões a máscara e já está. Ali em cima têm umas quantas”, explica Santiago, um dos mais entendidos na matéria.

O anfitrião é Nacho Allende, um basco de 45 anos , aka Torbe. É o criador de Putalocura (o site dele) onde podes pagar para ver os seus vídeos. Chega depois das sete. É graças a vídeos como os de hoje que é conhecido como o rei do porno freak. Torbe - de Torbellino, Turbilhão - abre a porta de casa (e do porno) a jovens, casais e aspirantes, há 14 anos. As paredes da Villacerda (com uma renda de 2.000 por mês) não estão insonorizadas, mas nunca teve queixa dos vizinhos. Atrasou-se porque não conseguiu dar o corpo ao manifesto: “Estava a gravar uma cena, mas atrofiei-me e a dita foi-se abaixo. Não há stress. Relaxas um bocadinho e pensas em coisas porcas, daquelas que te deixam mesmo em ponto de rebuçado e já está”. E pode-se saber em que é que pensaste? “Em bukkakes. Os bukkakes a mim deixam-me maluco”.

Não é a única coisa que tem em comum com os seus seguidores: Torbe pensou muito antes de entrar no mundo da pornografia. A ideia chamava-lhe a atenção, mas tinha vergonha que os amigos lhe vissem o rabo. Ri-se. Cada vez dá menos importância a este mundo, ou melhor, começa a estar cansado. E nota-se. Não são só as olheiras. Também há a madeixa branca que lhe sai do peito, e que mostra que não vai para novo. “Eu meti-me nisto por prazer, e ultimamente não tem sido mais que um trabalho. Quero mudar. Já vi e fiz tudo. Estou estagnado, tanto a nível criativo como económico. Passo o dia colado ao telefone, a assinar contratos…é uma seca. Criei isto para me divertir”, desabafa, antes que a sala de estar se encha de homens nus. “Eu queria ser realizador de cinema, mas a pornografia cruzou-se no meu camino. Foi um parêntesis de 14 anos. Quero fazer cinema convencional. Já agora, estou a preparar o meu primeiro filme normal. Vai chamar-se Putero”.

Entretanto, Nora, a responsável pela organização faz a chamada. Este sábado parece que não faltam assistentes: há 29 pessoas inscritas. Ou seja, nome, telefone, e o B.I. scaneado. Mas só apareceram 15. O dobro dos que estavam no portão. Alguns entram em boxers, e os outros como vieram ao mundo. “Quem tiver as análises do VHI pode foder sem preservativo. Os outros já sabem. Vão buscar as camisinhas”, explica esta rapariga de 21 anos. Alguns fazem-se de parvos. “Sobram-me seis preservativos, a mim não me enganam, vá, toca a andar!”. Apesar da sua juventude, tem uma assertividade do caraças. “Aos meus pais digo que sou secretária, e é verdade”.

Depois disto vem um desfile de risos, gemidos, uivos e gritinhos. Com a luz apagada, como nos disse o Jaime. A cabine treme por todos os lados. Pouco a pouco, o espaço vai ficando repleto de toalhetes enrugados. O ar torna-se irrespirável. Sémen e suor. Mas há quem acabe, e fique a ver. Como é o caso do Ernesto, designer gráfico, 28 anos. “Não exageres. Isto é como ver em casa. Ainda por cima a actriz é uma máquina”, explica o Ernesto, flácido.

“Estamos nisto há mais de meia hora. Aquele que não se venha em três minutos que tire a pila de cena”. Torbe perde a paciência. A rodagem está a demorar mais que o previsto. Não é fácil vir-se a toque de caixa. Mas o Santiago, o pro, acabou há um bom bocado, e observa vestido o desenlace da acção. O Jaime não conseguiu excitar-se. Não foi o único. “Isto é mais difícil do que eu pensava. Um gajo não se concentra com tantos gajos à volta”, lamenta o electricista. “Se estou numa de repetir? Pois não sei”.

O dono de Villacerda explica que, apenas um em cada quatro passa no casting para ser actor porno. “Só é preciso que a tenhas dura e que te venhas quando te dizem. Mas ou não conseguem pô-la dura, ou não aguentam , ou não se vêm”. E o que é que se faz nesses casos? “O que é que se faz? Pois às vezes usa-se gel Sanex para fingir uma ejeculação”. Os actores não cobram nada. “As que criam frenesim são as actrizes, e são pagas por isso. Como webcamers entre 700 e 2.000 euros ao mês. Se fazem só vídeos, entre 500 e 1.000. O que dá dinheiro são as cam. O porno tradicional já não vende”, aclara o criador de Putalocura.

No seu escritório há 100 raparigas em frente a uma câmara. A Natalia é uma delas, mas esse sábado trocou a câmara pela cabine. O seu nome de guerra é Blondie Fesser. É argentina. Tem 25 anos, e começou este ano com o Torbe e outras produtoras. Hoje era o seu segundo glory hole. Antes de dedicar-se a isto fazia fechaduras. Ganhava uns 1.200 euros. Mas já não aguentava ouvir: “Que mamas! Que cu! Que boazona!”. De maneira que um belo dia, enrolada numa toalha, decidiu tirar partido do seu corpo. Não sabe exactamente quanto pode ganhar num mês, mas calcula que não deve andar longe dos 4.000. Debaixo da mesa, ou depois de pagar impostos? Ninguém responde. Alguns assuntos, como a facturação total do sector, são tabú. A Vice quis saber a opinião de outra das produtoras de mais sucesso: Cumlouder. Mas o peixe morreu na praia e ficámos com a vontade. O Torbe explicou à sua maneira: “Não se ganha assim tanto, e muito menos agora”.

Talvez o problema seja que não existe um Observatório da Pornografia nacional, sugere o Salão Erótico de Barcelona. O antigo Festival Internacional de Cinema Erótico recebeu este ano 17.000 visitantes, 2.000 mais que na edição anterior. São os únicos números oficiais que existem: “Não nos dedicamos a quantificar nada, somos o ponto de encontro de um sector”. Os últimos dados contrastados são de 2009, e foram facilitados por este organismo. A facturação anual da industria do sexo desse ano foi de 420 milhões de euros face aos 470 milhões de 2008. Quantias demasiado astronómicas para vê-las desde um buraquinho.

 
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