A masturbação - Dos mitos antigos à realidade actual
Publicado em 2012-07-03 na categoria Absex / Sexo solitário


Considerada por muitos como um acto degradante, amoral, impuro e anti-natural, a masturbação tem sido bastante criticada continuando a influenciar um grande número de pessoas. Embora actualmente seja uma forma de conduta social parcialmente aceite nas sociedades ocidentais, ainda resta alguma falta de informação e malformação que se acumu­laram sobre esta durante vários séculos.

Pode-se definir a masturbação como a obtenção de prazer sexual em solitário através de qualquer tipo de estimulação física. Ainda que esta mesma estimulação possa ser recebida do companheiro sexual, este artigo refere-se à masturbação quando a excitação ou o estímulo sexual são efectuados pela própria pessoa e não formam parte da actividade sexual com um parceiro.

A masturbação costuma ter início na infância ou na adolescência e pode dar-se nos dois sexos ao longo de toda a vida. Num estudo recente (Malo de Molina, 1988), as respostas em relação à idade de início da masturbação deram os seguintes resultados: de sete a nove anos 7,7 %, de dez a doze anos 33,5%, de treze a quinze anos 43,2%, de 16 a 18 anos 13,9%, e depois dos deza­nove anos 1,7%.

No que se refere à percentagem de pes­soas que a praticavam, segundo este mesmo estudo, era de 83,5% nos homens e de 39,7% nas mulheres no intervalo de 14 a 19 anos, mas estas proporções igualavam-se no intervalo de ida­des compreendido entre os 30 e os 39 anos, passando a ser de 68,2% de homens e 53,5% de mulheres.

Como se pode observar, as condutas masculina e feminina apresentam valores distintos em relação à masturbação. Enquanto uma grande maioria dos homens se masturba na puberdade e na adolescência, são mui­tas mais as mulheres que o fazem nos últi­mos estádios da juventude e nas primeiras etapas da maturidade.

Um dos adjectivos mais frequentemente utilizados contra a masturbação é que se trata de um acto «anti-natural». Se por isso se entende que o «natural» é praticar o coito e não masturbar-se, tem que se colocar a questão sobre o que podem fazer as pes­soas que não têm companheiro, ou as que, ainda que o tenham, não podem manter relações por alguma motivo, incluindo a possibilidade de que o outro deseje uma menor frequência de encontros sexuais.

Se a suposta anti-naturalidade se refere a que a conduta masturbatória não se encontra na natureza, deve-se concluir que esta afirmação é totalmente errada. A masturbação é uma prática comum em bastantes espécies animais e em distintas sociedades humanas. Tal como referem Ford e Beach, os símios e os macacos machos manipulam o pénis com uma mão ou com um pé, ou então levam-no à boca; os elefantes machos fazem-no com a tromba; os cães e os gatos lambem regular­ mente o órgão sexual, mostrando às vezes movimentos pélvicos viris. Também foram descritas condutas masturbatórias nos gol­finhos em forma de fricções contra o chão dos tanques ou de manter o pénis na saída dos jactos de água. Nas fêmeas destes e de outros animais o comportamento masturbatório é menos frequente e não produz os efeitos claros do orgasmo observados no outro sexo.

No que concerne ao estudo de outras sociedades humanas, ressalta o facto de que, ainda que seja evidente a prática da masturbação, quase todas as sociedades rejeitam esta conduta quando é realizada na idade adulta. Um grande número de povos considera a masturbação como uma prática sexual “inferior”, ao interpretar que significa a incapacidade para obter um amante. Por outro lado, praticada na idade da puberdade e na adolescência, não só é permitida, mas também é estimulada, já que é considerada parte da aprendizagem sexual. Nestes povos a conduta masturbatória é vista como sendo natural e normal, e é frequente que os pais ou os adultos da povoação ensinem os mais jovens a mas­turbar-se. Com a idade, a auto-estimulação genital é substituída gradualmente por outras actividades sexuais.

As origens da má fama

A origem da palavra masturbação parece encontrar-se nas vozes latinas manus-stu­ prare que significam «manchar a mão». De qualquer maneira, nas civilizações antigas não se encontram muitas referên­cias sobre este tema, ainda que o médico grego Hipócrates afirme num dos seus escritos que um derrame de sémen exces­sivo (sem referir-se especificamente à mas­turbação) podia provocar o desgaste da medula espinal.

A nossa civilização ocidental também não prestou muita atenção ao tema. A Bíblia não contém nenhuma descrição nem comentário, ainda que o chamado «pecado de Onan» que, tal como é descrito no texto bíblico consistiu num coito interrompido, é frequentemente citado como sinónimo de masturbação. De facto, os termos ona­nismo e masturbação são utilizados como sinónimos, ainda que seja evidente que isto é fruto duma confusão. Ainda assim, sob este termo começou a condenar-se a mas­ turbação no princípio do século XVIII. Até então, esta conduta não tinha sido objecto de atenção e de restrição.

Foi um médico inglês, Bekker, quem, recolhendo o pensamento da Igreja contrá­rio às actividades sexuais não reproduti­vas, publicou em 1710 um livro titulado Onania ou o pecado atroz da auto-polução. Iniciava-se com isto a confusão terminoló­gica e a condenação explícita da actividade masturbatória.

O pecado de Onan

Num sentido amplo aplica-se o vocábulo onanismo como sinónimo de masturbação, prática sexual que habitualmente se considera que é condenada pela Bíblia. Qual é a história? Onan foi uma personagem bíblica cujo irmão morreu sem ter tido filhos no seu casamento. Segundo uma lei do povo hebreu, o irmão que, sobrevivia tinha a obrigação de casar-se com a viúva para dar-lhe filhos. Onan cumpriu a lei, mas pelos motivos que sejam, praticou o coitus interruptus e ejaculou no chão. Por este motivo, segundo o Génesis, Deus castigou-o matando-o, não por masturbar-se, mas por não ter querido fecundar a mulher do seu irmão e ter desperdiçado o seu sémen. A origem da confusão entre o onanismo e a masturbação remonta à Inglaterra de 1710, na qual um determinado doutor Bekker publicou um tratado titulado Onania no qual condenava o atroz pecado da auto-polução, fazendo uma falsa referência à Bíblia. A sua teoria foi recolhida por um distinguido científico francês, Samuel Auguste Tissot, que em 1758 publicou em Lausanne L'Onanisme, que tratava dos transtornos produzidos pela masturbação e que foi um dos best-sellers da época. 

A visão da masturbação como causa­dora de todo o tipo de males deve-se a outro médico, desta vez suíço, chamado Tissot. Em 1758 Tissot publicou O ona­nismo: Tratado sobre as desordens que produz a masturbação, dando ao tema um cariz pseu­docientífico. Este facto, unido à grande influência de Tissot no âmbito médico e eclesiástico da época, provocou que as suas ideias se divulgassem com grande rapidez e intensidade.

As suas teorias consistiam basicamente em que qualquer acto sexual produzia uma acumulação de sangue na cabeça, e dei­xava o resto do corpo sem irrigação san­guínea. Isto produzia uma degeneração dos nervos que conduzia à demência. Quando estas teorias, que não podiam ser contrastadas cientificamente nesta época, se implantaram nos Estados Unidos, divul­garam-se e fortaleceram-se ainda mais. Assim, quase toda a classe média mundial admitia que a masturbação provocava a loucura, a epilepsia, debilidade e, regra geral, uma diminuição das capacidades intelectuais e mentais.

Tudo isto contribuiu para que a mastur­bação fosse considerada uma conduta aberrante e perversa, sendo severamente condenada e reprimida pela Igreja, pelos médicos e pelos pais, temerosos de tão terríveis consequências.

Os métodos usados para combater a masturbação desde o final do século XVIII até ao princípio do século XX são muito diversos. Desde as dietas, nas quais se suprimia qualquer substância que se pen­sasse que podia ser «irritante sexual», a todo o tipo de normas, como o emprego de camisas de forças ou de lençóis frios. Che­garam a ter uma patente, uns anéis que continham puas interiores que se coloca­vam à volta do pénis quando se ia dormir e se espetavam neste se se produzia uma erecção.

Em meados do século XX os médicos começaram a modificar os seus critérios e a sustentar as suas afirmações em relação ao tema em estudos científicos, que demonstra­ram a falta de vinculação entre a mastur­bação e as doenças. Além disso, hoje em dia ainda circulam tratados nos quais a masturbação é incluída entre as perversões sexuais, e permanecem na mente de muitas pessoas vestígios deste conceito.

A realidade actual

Efectivamente, nas consultas de sexologia não faltam pessoas que atribuem a causa do seu problema sexual à masturbação, ou pessoas que pensam que masturbar-se pro­vocar-lhes-á esterilidade ou fadiga. Ainda que a atitude da sociedade em relação à masturbação seja actualmente mais tole­rante, todavia existem defensores das ve­lhas teorias. Num estudo realizado entre universitários descobriu-se que 32 por cento dos homens e catorze por cento das mulheres opinava que a masturbação cons­tituía um desperdício de energia, que era um acto imoral ou que produzia sentimen­tos auto-degradantes.

Dentro do conjunto de pessoas que evi­tam a masturbação estão aqueles que o fazem por motivos religiosos, sob o pressu­posto de que se trata de um acto pecami­noso. Diversos estudos, alguns deles recentes, demonstraram que os crentes se masturbam em menor percentagem e com menor frequência que os não crentes. É evi­dente que o problema moral não admite uma análise científica e, portanto, é uma questão pessoal que cada um deve resolver em função das suas crenças morais ou reli­giosas.

Hoje sabemos que inúmeras pessoas se masturbam, e que a masturbação, longe de ser um problema, é um elemento impor­tante de aprendizagem sexual. A falta de experiência masturbatória origina mais frequentemente problemas sexuais com o companheiro. A masturbação também é, para muitos adolescentes e pessoas adultas sem companheiro, a única via de escape sexual que possuem.

Em algumas circunstâncias, a mastur­bação pode ir associada a determinadas condições patológicas, podendo parecer que é esta a responsável pelo problema quando na realidade é o contrário: a mas­ turbação é a consequência dum problema que deve ser resolvido. Este erro frequente já foi utilizado por Tissot para «provar» as suas teorias, referindo o facto de que muitos doentes mentais se masturbam fre­quentemente, como «prova» de que a mas­turbação produzia doenças mentais, quando não era mais do que o resultado da desinibição de condutas que estes doentes sofrem.

Da mesma forma, existem pessoas que se masturbam compulsivamente e de forma excessiva. Nestas, o problema básico é um transtorno de ansiedade ou então uma personalidade obsessivo-compulsiva, e isto é o que é necessário tratar. Nestes casos não serve de nada reprimir a mastur­bação. Outras pessoas adultas podem usar sistematicamente a masturbação como substituto das relações sexuais com outras pessoas. Também aqui a masturbação é a consequência e não a causa de um pro­blema, que nestes casos costuma ser de fobia ou temor a enfrentar-se às relações.

Helen Kaplan resume muito bem a visão actual sobre a masturbação nestas pala­vras: «Na realidade, a masturbação representa um único perigo: a culpabilidade e a vergonha que sentem algumas pessoas devido a esta. Se um indivíduo se sente culpado pelo facto de se masturbar, se isto lhe provoca um conflito, se se preocupa pelas fantasias que acompanham este acto, estes sentimentos negativos podem ficar associados a todas as suas ideias e emoções sexuais, e isto,' evidentemente, não pode ser bom para a sua vida sexual».

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